Terapia EMDR.
O passado não deve nos assombrar, mas fundamentar nosso presente e futuro de modo resiliente e venturoso.
Silvana Salomoni
A decisão de iniciar ou retomar o processo de psicoterapia reflete persistência, coragem para mudar e desejo de levar uma vida melhor. A psicoterapia requer um ambiente que propicie condições de segurança para investigar o território psicológico, normalmente habitado por incertezas e desconhecimento, por fragilidades e simultaneamente por recursos de superação.
Antes de iniciar a intervenção com EMDR, o cliente precisa ser informado sobre o processo para obter melhor aproveitamento dessa abordagem psicoterápica que permite superar traumas antigos, recentes e aprimorar recursos pessoais.
Apesar de mobilizadores, os sintomas nem sempre são o melhor começo para trabalhar com EMDR. A queixa principal resulta de uma história de vida complexa, com momentos de conquista, bem como por obstáculos impostos por experiências traumáticas do passado. É importante levarmos em consideração a trajetória pessoal de cada um, e identificar quais lembranças positivas e negativas se relacionam aos sintomas perturbadores que contribuíram para a busca de psicoterapia.
A sistematização dessa pesquisa pode ocorrer por meio de levantamento cronológico das memórias mais significativas, ou seja, aquelas recordações que deveriam ser percebidas pela pessoa como pertencentes ao passado distante, mas que incomodam como se houvessem ocorrido há pouco tempo.
Feito esse levantamento, abre-se a possibilidade de acessar a memória traumática e reprocessar primeiramente o evento mais antigo até chegar aos dias atuais. Outro caminho pode ser iniciar pelos eventos menos perturbadores e seguir até as lembranças mais difíceis, ou vice-versa, conforme a necessidade de cada pessoa. Normalmente o reprocessamento de uma memória produz efeitos positivos em outras, com uma sensação de alívio generalizado.
Esse percurso de cura provavelmente demandará algumas sessões. De início escolhem-se os estímulos a serem empregados para auxiliar os hemisférios cerebrais a “metabolizar” o conteúdo emocional ainda não processado. Além da estimulação visual, há ainda a auditiva ou a tátil, que também podem ser utilizadas.
Durante o reprocessamento, é importante que o cliente tenha a sensação de controle. Cada indivíduo estipula seu próprio ritmo. A qualquer momento, poderá solicitar que a estimulação seja intensificada, acelerada, diminuída, modificada ou mesmo interrompida. Algumas pessoas sentem certo desconforto – em geral transitório – durante a recordação de situações delicadas do passado. Esse é um sinal de que mecanismos cerebrais de cura se encontram em atividade.
Depois do acesso estruturado da recordação traumática, segue-se a estimulação bilateral. Inicialmente são feitos poucos movimentos para que a pessoa se familiarize com o método de trabalho. Aos poucos, a frequência ou a intensidade da estimulação é aumentada. É como se fosse um carro que ganha velocidade para uma viagem que inclui trechos com trepidação. Quanto maior a aceleração, mais rapidamente esse material difícil e penoso pode ser atravessado.
Um dos elementos relevantes do EMDR denomina-se atenção dual. Isso significa a preservação simultânea de um foco de atenção na memória perturbadora a ser elaborada e outro foco no presente. Trata-se, portanto, do trânsito de atenção entre presente e passado. Algo do passado desperta medo, dor, tristeza, vergonha, raiva, etc.; mas é possível senti-lo com a sensação de estar a salvo no momento.
O acesso das vias neurais do cérebro prescinde da atenção forçada do cliente para funcionar. À semelhança da meditação, basta observar! Normalmente o começo é mais difícil. Com o andamento do processo, contudo, as impressões negativas tendem a ser substituídas por pensamentos positivos e sensações orgânicas de bem-estar.
Como saber se algo foi ou não reprocessado? Quando uma lembrança que deveria estar no passado ainda incomoda como se estivesse no presente, cheia de detalhes como se houvesse ocorrido há pouco tempo, é forte indício de que haja fardo sendo carregado desnecessariamente. Quando uma lembrança que foi reprocessada passa a ser percebida com mais distanciamento, indica que estamos no caminho certo. É comum que a redução do incômodo seja acompanhada pela recuperação de outras lembranças positivas, cujo acesso era impedido por desconfortos do passado.
O EMDR é uma terapia relativamente não verbal. Durante o reprocessamento não é preciso conversar com o terapeuta “para sarar”. Apenas observar o que surge na mente ou no corpo da pessoa. Nos intervalos entre as séries de movimentos bilaterais pode-se compartilhar resumidamente o que o cliente percebeu. Não é preciso relatar pormenores. Após a sessão, lembranças e sensações adicionais podem surgir. Quaisquer impressões, recordações ou sonhos devem ser anotados e discutidos na sessão seguinte. Caso persistam dúvidas, sinta-se à vontade para esclarecê-las antes de prosseguir.